sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Estudantes do interior do RN descobrem forma de conservar frutas usando cera de abelha

Por: Darliany Melo
O estudante Francisco Jociel Fernandes, de 17 anos, sempre foi um curioso. Na vida, segue à risca a filosofia do químico francês Antoine Lavoisier (1743-1794), em que, na natureza, nada se cria, mas tudo se transforma. Filho de agricultores, ele queria que a pequena produção de mel do seu sítio, na cidade de Apodi, pudesse ter novos usos e, assim, incrementar a renda familiar. Ao lado de dois amigos da escola, buscou novas funções à cera de abelha. O resultado foi uma película protetora para a conservação de frutas. O produto consegue protege os alimentos por até 75 dias. No início de março, venceram a Feira Brasileira de Ciências e Engenharia (Febrace), da Universidade de São Paulo (USP), nas categorias Empreendedorismo e Ciências Agrárias.      
               O período de pesquisa durou todo o ano de 2012. O embrião do estudo surgiu com uma dúvida. “Eu via aquela cera toda sem serventia e pensava no que eu poderia fazer com isso. Mais de 90% da produção se perdia com o tempo. Não tínhamos para quem vender e o que reutilizávamos era para fortalecer a estrutura de outras colmeias”, lembra Fernandes.

Antes da pesquisa, num livro de história, leu que os egípcios utilizavam a cera de abelha para conservar os corpos dos faraós – durante o processo de mumificação. “Aí, surgiu uma ideia: que tal usar a cera para preservar alimentos? Meu pai produz mamão e goiaba, mas que logo se desperdiçavam, quando não eram logo comercializadas. Nosso foco foi esse, a conservação da produção agrícola”, conta.

Depois disso, com a ajuda do programa “Ciências para Todos no Semiárido Potiguar”, realizado pela Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa), eles iniciaram as avaliações sobre a viabilidade da pesquisa. O programa público também conta a parceria com a Secretaria de Estado da Educação e Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern).

No início, as experiências eram feitas na cozinha da escola em que o grupo estava matriculado, a Escola Estadual professora Zenilda Gama, no centro de Apodi, e utilizavam as panelas e colheres da instituição. “A cozinha era nosso laboratório”, lembra Fernandes. Depois de algum tempo, parte das análises foram feitas num laboratório de química da Ufersa, no campus existente em Apodi.

Outro participante da pesquisa, Antonio Torres Geracino, 18 anos, lembra que apesar das boas perspectivas da pesquisa, nenhum professor apoiou o grupo. “Ninguém acreditava nosso trabalho. Achavam que era uma loucura. Mas nós sabíamos que era algo interessante e com potencial”, comenta. O único auxílio partiu da coordenadora pedagógica da instituição pública de ensino, que virou a orientadora do projeto – uma obrigação técnica para participar de feiras científicas.

Depois de algumas experiências para melhorar a consistência do produto, os estudantes passaram a utilizar alguns reagentes, todos orgânicos, para formar o produto. Nos primeiros testes nada deu certo; e avaliaram a melhor forma de produzir a cera e como ela se fixava sobre as frutas. “A cera é bem inflamável e qualquer erro no manuseio nos fazia perder a amostra. O começo foi terrível, mas tinha de ser assim mesmo. Todos os grandes cientistas sofreram nos primeiros experimentos”, lembra Geracino.

Patente
Com muito esforço, os três conseguiram a fórmula ideal para a conservação. A fórmula, aliás, eles guardam a “sete chaves”. A intenção dos três é abrir uma empresa a partir do produto. O grupo já até iniciou o trabalho de registro da patente.

Queremos trabalhar com isso, sim. Já temos até um nome para o produto, a “Abelha Feliz”. Nosso objetivo é conseguir substituir estes produtos químicos utilizados para proteger a colheita da fruticultura. Nosso produto é uma produção natural, orgânica, e é economicamente viável”, explica Francisco Jociel Fernandes.

A meta dos três, que estão encerrando este ano o ensino médio, é ingressar na faculdade de química ou de engenharia de alimentos. Os estudantes querem melhorar ainda mais a invenção. “Se possível, buscar outros usos para a cera de abelha. Esta substância é muito rica em nutrientes e pode ser muito útil ao ser humano”, detalha o jovem pesquisador.

Os três também estão iniciando os estudos para a produção em larga escala. A ideia, inicialmente, é comercializar para os produtores agrícolas da região de Apodi. O custo do produto é outra vantagem para a comercialização. O quilo da fruta utilizando a cera é apenas R$ 0,40 mais caro que o da produção normal. “Temos de avaliar melhor como iremos comercializar a cera, mas temos certeza que será um sucesso”, comenta o estudante.


Produto conserva frutas por até 75 dias sem perda nutricional
O produto se mostrou eficaz, prolongando a vida útil das frutas após a colheita. A cera conserva o peso, retarda sua oxidação e ainda protege o alimento da ação de bactérias e fungos, devido à camada protetora. Isso em razão da própole, substância que tem ação fungicida e antibactericida. Os benefícios foram, inclusive, comprovados por um grupo de nutricionistas procurados pelos jovens pesquisadores.

Segundo os estudos, as frutas podem ser conservadas por até 75 dias, sem qualquer perda nutricional. Utilizando refrigeração, esse tempo pode ser até três vezes maior. “Nós até já fizemos a governadora comer uma goiaba com 40 dias de colhida. Ela só soube disso depois, claro, mas não reclamou, e até gostou”, diz Jociel Fernandes.

A película de cera que cobre o fruto não precisa ser retirada, lembra o outro participante da equipe, Huguenberg Oliveira Santos, 16. “Pode ser consumido com a cera mesmo. Aliás, é até melhor que seja assim. A cera de abelha combate a gengivite e a gastrite”, explica. Os benefícios médicos são comprovados clinicamente por uma infinidade de artigos científicos. “Só juntamos o útil ao agradável” completa o estudante.

O projeto “Cera de abelha no revestimento de frutas”, desenvolvido pelos três alunos já foi premiado em duas feiras científicas regionais, uma delas foi a Cientec, promovida pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). E entre os dias 11 e 14 de março, participaram da Feira de Brasileira de Ciências e engenharia (Febrace), uma competição organizada pela Universidade de São Paulo (USP). Eles competiram contra 300 projetos científicos, sendo que mais da metade vindos de escolas das regiões Sul e Sudeste. Saíram vencedores das categorias de Empreendedorismo e Ciências Agrárias.

“Eu não achei que iríamos ganhar. Nosso trabalho é bom, mas pintou aquele impacto. Era tudo muito grande, diferente, e nós estávamos apenas com algumas frutas e a cera. Era tanto projeto interessante, muitos vindos de escolas com laboratórios sofisticados, que ficamos com medo até de participar. Depois que apresentamos o nosso projeto, não paravam de nos parabenizar. Apesar das dificuldades, nós fizemos algo novo e comercialmente viável”, lembra Francisco Jociel Fernandes.

A Febrace é considerada a maior feira de ciências e engenharia voltada para estudantes pré-universitários do País. Após a vitória, os três alunos foram convidados para publicar a pesquisa na revista “Inciência”.

O mérito não é nosso. O que fizemos vai servir para milhares alunos do Rio Grande do Norte. Sofremos, lutamos e trabalhamos muito. Não tínhamos tempo para discutir o projeto. O ponto de encontro era a escola. O engraçado é que não tínhamos, e nem temos, um laboratório. Tudo foi feito na cozinha escolar. Depois disso, utilizamos os recursos da Ufersa, nada demais; era apenas para comprovar nossas avaliações. O que queremos mostrar é que qualquer estudante de escola pública pode fazer ciência. Não somos piores ou melhores que ninguém. Só pedimos uma oportunidade de vencer”, comentou Fernandes.

Para a coordenadora pedagógica da Escola Estadual Zenilde Torres, Antônia Gidélia Oliveira, a vitória dos alunos não deve ser tida apenas como uma história de superação. Ela argumenta que os alunos potiguares possuem uma força inata, um desejo criativo, que não está sendo explorado pelas escolas. “A pesquisa está no sangue, basta um pouco de incentivo. Todos têm ideias para inventar um mundo melhor. Este três alunos não são únicos, e ninguém é melhor que ninguém aqui. A diferença é que eles foram incentivados e lutaram por aquilo que acreditavam”, finalizou.


O que é ?

O uso cera de abelha no revestimento de frutas. Através de um processo de derretimento da cera, utilizando alguns reagentes, as frutas são revestidas por uma leve película. O processo protege as frutas por até 75 dias. 
A fruta não perde peso ou nutrientes. A cera também possui efeitos medicinais. Como possui própoles na formação, também antibactericida.
<http://www.novojornal.jor.br/_conteudo/2013/03/cidades/9487-estudantes-do-interior-do-rn-descobrem-forma-de-conservar-frutas-usando-cera-de-abelha.php>

Um comentário:

  1. O bom é ver que apesar das dificuldades, eles não desistiram.

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